Reforma trabalhista: resistir e avançar!
O
mundo passa por profundas transformações econômicas e políticas. A produção
econômica muda com a globalização do domínio do capital financeiro sobre a
propriedade das empresas e das reservas naturais. Aos investidores são
oferecidos rápidos e crescentes retornos, que engordam a riqueza já
extremamente concentrada.
Uma
nova onda de mudanças tecnológicas integra plataformas de produção de bens e
serviços em âmbito global e acelera as mudanças. A tecnologia substitui, em
quantidades inimagináveis, a força de trabalho humana, desempregando e
submetendo os trabalhadores à precarização, insegurança, ansiedade, pobreza, ao
desespero e a outros tipos de mazelas ainda desconhecidas.
Na
vida política, as democracias cada vez mais são entendidas pelo mercado como um
mal necessário, a ser limitado. As instituições são sistematicamente
fragilizadas, controladas e induzidas para resultados esperados pelo mercado;
os poderes Executivo e Legislativo, submetidos ao controle do dinheiro,
enquanto o Judiciário é animado a ser o vigilante garantidor da propriedade,
dos valores e direitos do capital. Há liberdade para consentir, há repressão se
divergir e, se necessário, eliminam-se oposições. A política se curva ao deus
dinheiro.
Os
meios de comunicação e as redes sociais espalham ideias, valores e induzem
comportamentos. As classes médias, serviçais ideológicas dos ricos, exprimem o
ódio aos pobres, negros, imigrantes e a todos os excluídos.
O
Brasil se integrou plenamente neste jogo. Simultaneamente, realizam-se no país
enormes transferências das riquezas naturais e empresas, estatais e privadas,
ao capital internacional. Uma desnacionalização em magnitude desconhecida no
mundo capitalista se opera em meses, esquartejando empresas, desprotegendo
reservas naturais, abrindo espaço aéreo e marítimo, enfim, vendendo barato,
cedendo, tudo feito para o bom e livre funcionamento do mercado. Silenciosa,
essa operação de ataque ao país acontece enquanto parte da nação desconhece o
que ocorre e a outra olha atônita, sem acreditar no que vê.
Nesse
movimento, a mudança constitucional, que colocou limites aos gastos públicos
federais, promete deixar o estado reduzido à metade, em 20 anos, definindo por
duas décadas o espaço fiscal da democracia e do voto!
O
programa de desestatização é financiado com dinheiro público, por meio do BNDES
(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). As imensas dividas das
empresas com impostos são perdoadas. A grave crise econômica coloca os
patrimônios produtivos à venda a preço de banana. Terras, minérios, água
potável e florestas oferecidos a estrangeiros. Investidores, empresas privadas
e estatais do mundo inteiro adquirem por precinho módico riquezas únicas!
Recentemente,
em mais um lance ousado, Legislativo e Executivo transformaram profundamente a
legislação trabalhista. A lei deixou de ser um sistema protetor dos
trabalhadores para passar a proteger as empresas.
A
reforma alterou a hierarquia normativa em que Constituição, legislação,
convenções coletivas e acordos eram pisos progressivos de direito. A partir de
agora, a Constituição passa a ser um teto, a legislação, uma referência de
direitos que poderão ser reduzidos pelas convenções; os acordos poderão
diminuir garantias previstas em leis e convenções; o indivíduo poderá abrir mão
de muito do que foi conquistado a duras penas. Os trabalhadores e os sindicatos
“ganharam o livre direito” para reduzir salários, garantias, flexibilizar
contratos, ampliar ou reduzir jornada, quitar definitivamente, na presença
coercitiva do empregador, os direitos. O acesso dos trabalhadores à justiça foi
limitado. Já as empresas ganharam inúmeros instrumentos que dão a máxima
garantia e proteção jurídica e estão livres e seguras para ajustar o custo do
trabalho.
São
parte das mudanças vários novos contratos de trabalho (tempo parcial, trabalho
temporário, trabalho intermitente, autônomo exclusivo, terceirizado sem limite,
teletrabalho) que permitem ajustar o volume de trabalho à produção no dia, na
semana, no mês, ao longo do ano. Esses contratos podem ter ampla flexibilização
em termos de jornada (duração, intervalos, férias, banco de horas etc.). As
definições do que é salário são alteradas e os valores podem ser reduzidos,
assim como outras obrigações legais. A demissão é facilitada, inclusive a
coletiva, com formas diversas de quitação definitiva de débitos trabalhistas.
O
poder de negociação dos sindicatos é fragilizado, com o “novo poder” de reduzir
direitos, a interposição de comissões de representação dos trabalhadores, nas
quais é proibida a participação sindical, ou com o empoderamento do indivíduo
para negociar diretamente, medidas que, enfim, quebram o papel sindical de
escudo coletivo e protetor. Como já ocorre em outros países que adotam
mecanismos semelhantes, os trabalhadores serão incentivados e estimulados, por
meio de inúmeras práticas antissindicais e de submissão patronal, a não apoiar
ou financiar os sindicatos. Ficarão submetidos ao poder das empresas,
pressionados para aceitar acordos espúrios diante do medo de perder o emprego.
A
justiça do trabalho, que agora será paga, terá sua tarefa reduzida à análise
formal dos pleitos. A lei criou uma tabela que precifica o ônus da empresa até,
no máximo, 50 vezes o salário do trabalhador!
São
mais de 300 alterações na legislação trabalhista operando um verdadeiro ataque
aos trabalhadores. A reforma trabalhista brasileira é um exemplo extremo,
comparada a outras 640 realizadas em 110 países entre 2008 a 2014.
Mas
a vida em sociedade tem caráter de um jogo em aberto, que exige fôlego para
continuar permanentemente correndo e lutando para mudar o resultado. A história
mostra que os oprimidos e derrotados constroem suas respostas, sempre!
Não
há outro caminho que não seja o da resistência em todas as frentes. Será
preciso unir os que discordam da maldade embutida nas reformas e na opção
colonialista de entrega da soberania nacional.
Essa
nova legislação ampliará os conflitos trabalhistas e, provavelmente, os
sociais. E, depois de deflagrados, será difícil contê-los.
O
projeto que sustenta essa reforma trabalhista é social e politicamente
medíocre, porque desconsidera que o processo civilizatório, no capitalismo,
significou a estruturação de um mercado regulado na produção e distribuição dos
resultados por instituições fortes, diálogo social e organizações representativas.