Agronegócio sente crise e perde empregos, produção e receita
Se em 2015 o agronegócio ajudou a
evitar um tombo ainda maior da economia brasileira, neste ano ele engrossa os
dados negativos do PIB. Pela segunda vez em 20 anos, o setor acumula três trimestres
seguidos de retração e perdeu vagas de trabalho, influenciado pela queda das
produções de culturas como milho, algodão, laranja e cana-de-açúcar.
A agricultura recuou 6,9% no
terceiro trimestre de 2016 frente ao mesmo período do ano passado, segundo
dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre o PIB,
anunciados nesta quarta-feira (30). Foi o maior tombo para o período desde o
início da série histórica do indicador, em 1996. “Em 2016, a gente teve um
grande problema: a perda de produção. Não fosse isso, tenho a impressão de que
o segmento ficaria no zero, zero e pouco, ou teria uma queda menor. O
‘complicador’ da temporada, além da crise no país, foi a perda de
produtividade, principalmente nas safras de soja e milho", explica o
consultor de agronegócio Flávio França Junior.
O maior responsável pelo
resultado negativo da agricultura foi o clima, de acordo com os especialistas. A
área plantada chegou a aumentar, segundo o França Junior. Diante de um clima
regular, os efeitos climáticos foram piores. “O ano foi bem fraco mesmo, e não
tem jeito, vai fechar no vermelho”, afirma.
Seca devastou hectares do milho
O pequeno agricultor Jocelen
Alves, de Ponta Porã, a 326 quilômetros de Campo Grande (MS), perdeu quase tudo
o que plantou na segunda safra de milho desta temporada. Dos 70 hectares que
cultivou, 50 foram atingidos por uma estiagem de mais de 42 dias e os 20
hectares que restaram foram afetados por uma geada.
De uma produtividade que ele
esperava ser superior a 80 sacas por hectare, colheu apenas 12. “Nunca vivemos
um ano tão ruim como este. Nos outros sempre conseguíamos pagar as contas com a
lavoura, neste vamos ter que tirar de outro lugar”, diz o produtor.
A história do produtor, que se
repetiu em maior ou menor intensidade em todo o Mato Grosso do Sul nesta
safrinha e contribuiu para uma quebra de 34% na produção do cereal no estado,
de uma projeção de de 9,1 milhões de toneladas para uma colheita de 6 milhões
de toneladas, ajuda a entender o porquê dos resultados negativos do cultivo do
grão estarem sendo apontados como um dos principais responsáveis pela queda do
PIB da agropecuária no terceiro trimestre.
O economista Fabio Ralston,
diretor de Commodities na consultoria Parallaxis, aponta a quebra da safrinha
como grande “vilã” para que a agropecuária tivesse um resultado negativo de
1,4% no terceiro trimestre deste ano em relação ao trimestre anterior. “A
produção de milho safrinha vinha crescendo em todo o país nas temporadas
anteriores e em razão das variações do clima provocadas pelo fenômeno El Ninõ
sofreu um grande retração. No Centro-Oeste a queda chegou a 36,64%”, explica.
Chuva afetou cultura da cana
Uma das maiores produtoras de
cana-de-açúcar do país, a região de Piracicaba (SP) viu a produção cair 15%
este ano, segundo o presidente da cooperativa dos plantadores de cana do estado
de São Paulo (Coplacana), Arnaldo Antônio Bortoletto. O principal motivo foi o
clima desfavorável à cultura canavieira. “No final do ano passado, choveu muito
e nós tivemos que colher com um solo muito úmido, o que refletiu na produção
deste ano”, afirmou Bortoletto.
A safra costuma começar no fim de
março e terminar em dezembro. Este ano, com a baixa produtividade, o término
foi antecipado para outubro, o que levou a demissões. “Tivemos que dispensar o
pessoal mais cedo e o produtor teve que apertar mais o caixa porque a receita
foi menor”, disse Bortoletto.
Recessão bateu na porta do agronegócio
Para o diretor-executivo da
Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Luiz Cornacchoni, os reflexos da
recessão também bateram na porta do agronegócio este ano. “A queda no consumo
interno afetou segmentos importantes como a cadeia de carnes e de hortifrúti”,
avalia.
Segundo Cornacchoni, nem o
cenário mais favorável das exportações ajudou a compensar a demanda mais fraca
por produtos da agropecuária. Também a queda acumulada do dólar, de quase 20%
no primeiro semestre, reduziu a receita dos exportadores. “Mas este foi um
efeito marginal no setor”.
Mercado de trabalho em queda
Com a redução da produção, houve
queda do número de trabalhadores no segmento. A Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios (PNAD), também do IBGE, indica que o agronegócio perdeu mais de
800 mil trabalhadores no ano passado – a maior retração da série histórica.
“Isso tem muito a ver com a mecanização do trabalho, com a substituição da mão
de obra, com o setor cada vez mais modernizado e precisando de menos gente”,
analisa a gerente do Pnad, Maria Lúcia Vieira.
FONTE: Globo.com